domingo, 19 de setembro de 2010

Confortáveis e perigosas

Sentir-se bem-sucedido, ter a demanda estabilizada, chegar finalmente àquela fase do campeonato em que as receitas vencem regularmente as despesas, é um momento feliz para qualquer empresa ou profissional em ascensão. Quando, junto com alguns clientes de maior porte, se conquista a sonhada estabilidade, a sensação de prazer é grande. Depois de muita luta se alcança uma “zona de conforto”... e aí é que mora o perigo chamado acomodação.
“Conseguimos!” – é a trombeta que soa na cabeça de todos. A meta tão perseguida nos últimos tempos foi finalmente atingida. “Vencemos!” E o que faz um atleta depois de vencer um campeonato? Vai pro chuveiro, toma uma boa ducha e saboreia a vitória. Depois da adrenalina que nos agita, vem a endorfina, que nos relaxa e tranqüiliza. Acontece que, assim como o atleta terá pela frente outros torneios, a empresa e o profissional também enfrentarão novos desafios.
Corre mundo via Internet a história do sapo, que salta fora se for jogado em água fervente, mas, se jogado em água fria que se aquece lentamente, acaba morrendo cozido porque não sente a temperatura subindo. É mais ou menos como Ministro ou técnico de futebol sendo “fritado” em fogo brando. Está prestigiado... conta com o apoio do presidente... continua prestigiado... até que...
Quando uma empresa (ou profissional) alcança uma “zona de conforto”, se acredita que “chegou lá”, corre sério risco de se tornar refém dos clientes conquistados – exatamente aqueles clientes maiores - que “sustentam a casa” e garantem a estabilidade. Passar a gravitar em torno desses clientes, dando-se por satisfeito, é tornar-se dependente deles e – fatalmente esse dia chegará – ficar desamparado quando eles forem embora. Porque clientes vão embora, mesmo quando fazemos tudo certinho. Pelos mais variados motivos: porque morrem, não conseguem se reeleger, mudam de ramo ou de cidade, envelhecem, passam por fusões, incorporações ou reorganizações, ou porque, apesar de fazermos tudo certinho, um dia acabam preferindo um concorrente que surge com uma novidade “i-na-cre-di-tá-vel”. A realidade é dinâmica e, como já dizia o filósofo Macaco Simão, “quem fica parado é poste”. Estacionar em uma “zona de conforto” é entrar em lento declínio.
Mas o que leva uma empresa ou profissional a se acomodar, desfrutando a zona de conforto sem pretender alçar mais altos vôos? Preguiça? Falta de ambição? Falta de capacidade? Incompetência? – Geralmente, não.
Via de regra o que acontece é uma falha de programação, um lapso na definição de metas e objetivos. Mentaliza-se minuciosamente os desafios de médio prazo e não se dá o mesmo tratamento aos de longo prazo. Ao investir todas as energias nas metas intermediárias, a equipe (ou pessoa) perde a noção dos objetivos finais. E aí... ao conquistar os primeiros sucessos, tem a impressão de que já “chegou lá”. É mais ou menos como se o alpinista, ao atingir o primeiro platô, acreditasse já ter escalado o Himalaia. Isso acontece muitas vezes no futebol, quando a equipe que se acomoda com um placar favorável de um a zero ou dois a zero acaba perdendo de virada.
Uma experiência pessoal que ilustra bem o ponto: Em uma peça de teatro que dirigi, os produtores mentalizaram – e se esforçaram ao máximo para realizar – uma casa lotada na estréia. E de fato, no dia da estréia, o teatro estava superlotado. Mas só no dia da estréia!... Porque toda a promoção fora concentrada na estréia, sem levar em conta a temporada.
Traçar metas de médio prazo e não definir objetivos de longo prazo, tira a perspectiva de crescimento incessante − que é o alimento essencial de qualquer empreendimento − individual ou coletivo. Antes de atingirmos um patamar, precisamos ter planos traçados para alcançar níveis mais elevados, senão... tenderemos a estacionar no próximo patamar alcançado.
Para continuar crescendo, precisamos desejar sempre mais. Dar-se por satisfeito é o fim da picada. Mesmo.
Alberto Centurião

Nenhum comentário:

Postar um comentário